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86% de trabalhadoras negras relatam casos de racismo, revela pesquisa

Foram entrevistadas 155 mulheres, todas as entrevistadas têm nível superior e estão empregadas

No Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, comemorado nesta terça-feira (21), pesquisa aponta que 86% das mulheres negras já sofreram racismo nas empresas em que trabalham.

A pesquisa inédita ‘Mulheres Negras no Mercado de Trabalho”, realizada por meio da rede social Linkedin, pela consultoria Trilhas de Impacto, entre os anos de 2021 e 2022, ouviu 155 mulheres na faixa etária de 19 e 55 anos, sendo a média prevalente entre 30 e 45 anos e constatou que:

. 50,3% das entrevistadas têm nível superior e pós-graduação ou especialização;
. 13,5% têm mestrado e doutorado;
. 24,5% têm ensino superior completo.

Elas trabalham nas áreas de educação, recursos humanos, tecnologia da informação (TI) e análise de sistemas, telemarketing, relações-públicas, administração e comércio.

O fato de todas as mulheres entrevistadas terem curso superior completo e estarem empregadas foi considerado importante pela diretora-presidente da consultoria, Juliana Kaizer. “Chamou muito minha atenção que o fato de as pessoas terem nível superior ou pós-graduação não impede que elas sofram racismo. É assustador”, disse.

A pesquisadora também é uma mulher negra, professora do MBA em responsabilidade social e sustentabilidade do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do curso de diversidade da Escola de Negócios (IAG) da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). É ainda aluna de pós-graduação da Fundação Getulio Vargas e conselheira da Associação Brasileira de Recursos Humanos seção Rio de Janeiro (ABRH-RJ).

Mito
A pesquisa faz cair o mito da democracia racial que indica que, se a pessoa tiver um bom nível de educação, não vai sofrer racismo, diz Juliana.
Durante a análise dos dados, a pesquisadora percebeu que alguns aspectos se repetiam nos relatos e decidiu dividi-los em categorias para melhor compreensão dos resultados qualitativos.

. Mais de 70% das mulheres relataram que, durante a jornada profissional, precisavam explicar porque o cabelo estava alisado, era black, ou a razão de terem colocado lace nos cabelos (prótese feita fio a fio em uma tela de microtule).

. 68% das profissionais disseram ter sido confundidas, em algum momento, com a faxineira ou moça da limpeza da empresa. “Eu estou falando de mulheres com ensino superior completo e pós-graduação”, ressaltou Juliana.

Uma coordenadora de área contou que, todo dia, o líder do setor pedia para ela deixar arrumado o espaço pessoal e dos demais colegas. “Ela não conseguia entender por que lhe era pedido aquilo. Os colegas iam embora e ela ficava limpando a sala. Até que se deu conta de que estava sendo vítima de racismo. Mas demorou, porque ficou mais de um ano nessa situação”.

. Mais de 50% das consultadas disseram que a cor da pele e o lugar onde moravam foi perguntado durante as entrevistas online no recrutamento. “Elas perceberam que, durante as entrevistas, no processo seletivo, tudo ia muito bem no formato online, com análise do currículo, mas que, no momento da entrevista ao vivo, com a câmera aberta, os recrutadores, em geral mulheres brancas, voltavam atrás. “Esse foi também um aspecto que as profissionais negras falaram muito”, contou Juliana.

. O fato de 70% das respondentes terem pós-graduação não faz com que elas subam na empresa. “Muitas estão há dez anos no cargo, não veem nenhuma pessoa parecida com elas em cargo de liderança, enfim, não se sentem estimuladas”.

Distanciamento
Como pesquisadora negra, Juliana disse ter sido difícil sair um pouco dela mesma para focar na pesquisa de forma distanciada. “Porque estou falando de mim também. São barreiras pelas quais eu também passo. Se eu falo três idiomas, se moro fora do Brasil, não adianta. A cor da minha pele chega antes. E foi isso que a pesquisa mostrou. Muitas mulheres falam inglês, algumas têm mestrado e doutorado e são tratadas de uma forma aviltante. E, se tem racismo, é porque tem racistas”.

Mulheres que estão em cargos de coordenação e gerência afirmaram que quando descobriam que um colega branco desempenhava a mesma função mas tinha salário maior, e elas pleiteavam aumento, as empresas criavam um cargo para justificar que a outra pessoa, na mesma posição, ganhava mais. Todas, sem exceção, falaram de exaustão no trabalho, tendo que dar provas de competência o tempo todo e, ao mesmo tempo, não ganhar o suficiente para sobreviver.

Outro dado importante é que as mulheres negras não crescem na carreira profissional no Brasil. “Elas podem até crescer em cargos, mas não crescem em dinheiro”. Juliana destacou que 52% dos estudantes de universidades federais são negros e questionou por que essa prática não se repete nas empresas, com pessoas pretas em cargos de liderança, ganhando um bom dinheiro. De acordo com estudo do Instituto Ethos de 2020, mulheres negras representam 9,3% dos quadros das 500 maiores companhias do Brasil, mas estão presentes apenas em 0,4% dos altos cargos.

Ela espera que as empresas fiquem constrangidas diante do resultado da pesquisa e que isso possa levar a uma mudança de comportamento. “A gente tem um problema para resolver enquanto nação”. Na pesquisa, das 155 entrevistadas, pelo menos 40 mulheres falaram das mesmas empresas e o nome de 16 dessas companhias se repetiu nas citações.

Com informações da Agência Brasil
foto divulgação

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